segunda-feira, 30 de abril de 2012

Avó esquecida




Vidas difíceis? Se as há!!!!
Há uma boa dúzia de anos que convivo diariamente com uma colega, hoje grande amiga, deficiente visual. Não partilhássemos tantos momentos juntas, nunca me aperceberia da dureza, da austeridade, muitas vezes do sem sentido da sua vida; o esforço, a concentração, o desgaste físico e psicológico permanentes que a cada momento lhe são exigidos, só podem ser ultrapassados com uma gigantesca resistência, uma resignação olímpica, um autêntico estoicismo!... Verdadeiro exemplo de vida... Já me tinha contado que aprendera com a sua avó, ainda em garota, a fazer todas a lides caseiras - limpar, cozinhar e até tricotar!!!
Um dia, estando a começar um dos meus miminhos, sem rumo definido, atrevi-me a pedir-lhe que me desse umas dicas... de imediato, sem nada ter previamente consultado, foi-me indicando ponto por ponto, carreira por carreira e o resultado final foi fantástico.
De tal forma gostei do efeito que me propus, logo que me me foi possível, fazer um outro aplicando os ensinamentos adquiridos;  mas... logo no início, me apercebi que o ponto não era o que constava do original - contudo, fui continuando para ver o produto da experiência. Na verdade a 2ª versão nada tinha a ver com a 1ª. Motivo(s) de tal disparidade? Apenas um: tinha-me esquecido de tricotar uma carreira de meia!!!
Sem qualquer intencionalidade, acabava de descobrir um ponto novo o que nada tem de inédito... - os portugueses também não descobriram fortuitamente o Brasil pensando que estavam a chegar à Índia?!
Eu que há um mês tinha estado com as "mãos na massa" não me lembrei de um pormenor... e ela, ao fim de quase 50 anos, nada lhe tinha falhado!...
É que, devido às circunstâncias, por falta de acessibilidades imediatas, os cegos recorrem a toda a hora à memorização, treinam desmesuradamente a memória e é sabido que é a função que faz o órgão...
"Eu tenho dois casaquinhos e não sei qual deles gosto mais!" como diria Marco Paulo...

terça-feira, 10 de abril de 2012

Avó injustiçada






A transitoriedade e a finitude da vida - tema tão comum, banal, tão comezinho, aparentemente tão interiorizado não fôssemos nós coagidos a questioná -lo de quando em quando, muito especialmente na chegada fulgurante da primavera.
A primavera está aí - arrebatadora, resplandecente, vigorosa; toda a natureza ressuscita, tudo à nossa volta renasce, rejuvenesce... o verde fica mais verde, o azul mais azul, o amarelo mais cintilante...
E nós?
Vamo-nos, paulatinamente, desbotando, perdendo a cor, a força, murchando, tornando-nos, em cada primavera, mais debilitados, definhando, definhando até que...
É justo termos uma só primavera na vida?
Rendendo-me à evidência da minha modesta condição de humana, resta-me não competir com o óbvio mas contrariá-lo, criando primavera à minha volta. Este casaquinho, todo ele inteiriço (ver fotos) de um rosa mais vivo que todas as cores vivas é bem sintomático da necessidade que sinto em contribuir e conviver com a "minha" primavera!...